* Sérgio Ciquera Rossi

A Constituição Republicana de 1988 e as leis que regem a concessão configuram-na como um contrato - posição essa defendida pela doutrina majoritária. Assim, dá-se uma relação jurídica que, apesar de manter as prerrogativas inerentes à Administração, não desconsidera que há consenso da outra parte, na confluência de interesses - em eixo sinalagmático. Conquanto tais aspectos sejam contumazes ao Direito, de se reconhecer que, nessas avenças – concessões -, a dificuldade em entender sua equação financeira parece ser questão intricada a quem a ela se dedicar, sobretudo nas concessões rodoviárias.

Induvidoso que qualquer investimento deve vir garantido pelo retorno financeiro seguro do que se pretende contratar. Isso porque, caso assim não o fosse, dificilmente seriam captados licitantes ou investidores para a consecução do objeto. Dentro de tal panorama, de se ressaltar que as áleas econômicas sempre estão devidamente previstas, formando parte inerente ao quanto pactuado. Busca-se, assim, a adequada remuneração do serviço e, concomitantemente, sua apropriada prestação.

Por isso que, nas concessões, vê-se que o retorno financeiro é cuidadosamente planejado, de forma a que não se torne frustrada a empreitada, em prejuízo ao interesse público – que, ao fim e ao cabo, é seguramente o principal objetivo da contratação. Trata-se de atividade de relevância coletiva, que não se restringe ao usuário de determinada rodovia. Por isso, usualmente há previsão milimétrica do aumento ou da diminuição da demanda, ponderando-se sempre a variação entre o planejamento do total de usuários e a efetiva constatação do resultado obtido.

Nesse panorama, as concessões parecem ser negócios altamente atrativos, que começam com inadiáveis reajustes de preços e desaguam no encontro de contas, sempre a favor da concessionária - que, claro, não pode trabalhar no vermelho. Noutros termos, observa- -se que, primordialmente, é feita a manutenção da equação econômica do contrato visando à recomposição do valor dantes pactuado para a contratada, em razão do regime inflacionário da economia.

Ocorre que a vantagem no aumento da demanda – que, destaco, está em escalada permanente diante do crescente aumento de veículos - não tem socorrido o eventual prejuízo por conta dos investimentos promovidos, segundo consta. Há a premissa comum de que a concessão tem sua vigência original fixada para garantir a amortização dos investimentos da contratada e aufira os lucros originalmente pactuados. Assim, quando tal margem não é lograda, prorroga-se a avença. E essa tem sido a solução: a dilatação da vigência contratual que, celebrada para 20 (vinte) anos, pode alcançar até 40 (quarenta) anos.

O fenômeno chama a atenção, já que o capital investido não pode ficar sujeito à sua diminuição; noutro ponto, se rescindido o contrato, certamente pesadas serão as indenizações. Tal cenário revela a recomendável – e urgente- necessidade de alteração dessa ‘política permanente de prorrogações’, a título de compensação. Isso porque a prática parece levar as contratações à espécie de vitaliciedade, em detrimento da realização de um novo certame. Outrossim, o adiamento acaba por revelar, inerentemente, a manutenção de incorreções e a ausência de melhorias, dado que a realização de nova licitação certamente viria cercada de mudanças colhidas com as experiências anteriores, buscando a superação de entraves dantes enfrentados.

De se ressaltar que tal ponderação não objetiva discutir a qualidade da malha rodoviária e do atendimento disponível. Antes, somente visa à reflexão sobre a injustificada permanência de avenças realizadas, mantidas com o fito de “recuperação de investimentos”. Abandona- -se, portanto, a possibilidade de que a concessão do serviço seja pactuada (e prestada) com menos custos para o Poder Público e, principalmente, para o cidadão.

Por fim, trata-se de opinião pessoal que não vincula qualquer decisão.

* Sérgio Ciquera Rossi é Secretário-Diretor Geral do Tribunal de Contas do Estado de São Paulo (TCESP)